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quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Vida Morte Vida, e o Mundo Gira*

Depois de alguns dias fora de casa, fui regar o jardim. Saudades imensas de todos que lá vivem, plantas, bichos, seres visíveis e invisíveis. E como acontece quando encontramos amigos de quem sentimos saudades, eu estava louca para saber das novidades.

O ingá de metro que plantei na frente da janela do meu quarto todo em flor! A primeira florada. Flores esvoaçantes de pistilos brancos exibicionistas. Estrelas brancas dançando com o vento. Pompons de natal cor de neve em pleno inverno tropical. Amo ingá de metro. Havia um deles no quintal da minha infância. Lá no fundo do quintal, que para mim era imenso, sem fim. Eu subia nele para colher aquelas vagens compridas e gordas, já em ponto de explodir para fora o algodão branco do seu interior. Ao abrir as vagens, aquele aroma adocicado da minha infância subia e penetrava meus sentidos. Pura delícia de fruta selvagem, não domesticada, nem melhorada, nem piorada pelos dedos dos homens tecnificados. Apenas pelos dedos daqueles que a amam comer e foram espalhando as sementes das frutas mais gostosas e carnudas por aí. Sementes pretas escorregadias que pedem para ir ao solo imediatamente. Recalcitrantes, não resistem muito tempo e perecem logo depois que sua polpa branca e cheirosa é comida. Prova de que é árvore da mata de galeria, da mata ciliar, da mata que fica na beira dos rios, mata sempre molhada que não se importa se lá fora é tempo de seca ou de água.

Segunda novidade: a pitangueira morreu. Aquela cujo fruto aparece no final do filme que fiz para o TEDx Buenos Aires e no qual mostro meu quintal agroflorestal. A mãe daquele fruto que aparece imenso sobre a mão de Janaína, minha filha caçula. Aquele fruto foi um dos últimos, imenso e produzido fora de época só para enfeitar o filme, junto com outros 3. E a pitangueira morreu. Parte das folhas secaram ainda presas à árvore. Fiquei muito tempo observando e tentando compreender o que havia acontecido. Até que, de repente, me dei conta de que não se tratava de compreender, mas simplesmente de aceitar. E também agradecer pelas tantas colheitas maravilhosas que forraram o chão ao seu redor e nossos pratos de vermelho. Pensei no ho'oponopono: sinto muito, me perdoe, tem amo e sou grata. Tenho feito essa oração acrescentando antes dessas afirmações: eu aceito.

Ali, de pé, aceitando a morte da pitangueira, olho para baixo e o que vejo? Muitos e muitos filhotes da pitangueira. De vários tamanhos. Logo crescerão e produzirão deliciosos frutos também. E o ciclo recomeça, cada vez mais abundante, em novo patamar de aceitação, perdão, gratidão e amor.

* Texto publicado originalmente na edição de 31 de agosto de 2012 do Jornal "Deusa Viva", da Teia de Thea (www.teiadethea.org).

Um comentário:

  1. Lindo texto, Helena, como sempre. Boa pitangueira nova pra vc.
    Beijo grande.

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