Ninguém sabe exatamente o que vai acontecer no futuro, mas existe uma sensação geral e dados científicos que indicam que algo JÁ está acontecendo com o clima da Terra. Uma das questões mais importantes e talvez a menos tratada com relação à mudança do clima é o trânsito das coisas. Talvez algo como metade de toda a energia que gastamos no planeta é utilizada para transportar coisas e pessoas de um lado para o outro. Talvez mais. Mais de 30% das emissões brasileiras de gases do efeito estufa se devem ao transporte. Por que será que esse não é assunto prioritário nas políticas, planos e estratégias em pauta?
Dou um dos muitos exemplos possíveis: Vejam quanta energia é gasta em transporte para que uma porta de madeira de lei da Amazônia seja utilizada na reforma de um apartamento aqui em Brasília: Os tratores e demais ferramentas e máquinas utilizados na extração da madeira podem ter sido fabricados em Canoas/RS com ferro que foi transportado de jazidas da Bahia ou de Carajás/PA. O diesel para movimentar tratores e máquinas na Amazônia talvez tenha vindo de uma refinaria do Rio de Janeiro. E os componentes eletrônicos? Quem sabe tenham vindo da China. E o banco do trator? E os componentes de plástico do trator, de onde saíram até chegarem em Canoas? e assim por diante... Depois de extraída e serrada, mais energia é gasta para transportar a madeira em tábuas até Brasília. Isso sem falar do transporte de pessoas e alimento para o local da extração, cada vez mais distante, já que a extração de madeira de lei na Amazônia ainda é, pasmem, muito mais uma estratégia para o desmatamento do que fruto de manejo sustentado.
Não seria muito mais inteligente rodear Brasília de florestas diversificadas de madeira de lei? Além de ficar lindíssimo, o clima seria, certamente, mais ameno, a umidade do ar, maior. As águas voltariam a correr alimentando os principais rios do Brasil que aqui nascem. Se essa madeira for plantada em agrofloresta, teremos também muitas centenas de toneladas de alimentos produzidos localmente. São só vantagens. Então por que continuamos trazendo madeira lá da Amazônia ao invés de produzir localmente? Por que, ao nosso redor, geramos destruição ao invés de gerar a vida que gera a matéria prima que necessitamos para nossas atividades? Por que não fabricamos aqui mesmo, no DF, as máquinas necessárias para realizar todo o processo? Por que não produzimos aqui mesmo todo o alimento que consumimos?
Tenho alguns palpites: Na nossa economia distorcida, ganha-se mais dinheiro com o transporte do que com o que é transportado. Transportadoras, fábricas de caminhões, impostos e, principalmente, petróleo, fazem a roda da fortuna girar. Porque será que nenhum plano relacionado à questão do clima fala de reduzirmos a produção de petróleo, ponto de partida se há real preocupação com o clima? Outro palpite: Lamentavelmente, o grande negócio na Amazônia ainda é, como era há 100 anos, a especulação da terra. O grande negócio ainda é ganhar dinheiro desmatando a terra para vendê-la ao pecuarista (já temos mais cabeça de gado no Brasil do que pessoas... e eles emitem metano, um dos mais potentes gases do efeito estufa). É incrível, mas a terra nua ainda é mais valiosa do que a terra com floresta, considerada improdutiva! Que economia é essa que nos faz viver sob a ameaça de que se não gerarmos divisas, se não exportarmos mais do que importamos, o país quebra?
Por tudo isso, é hora de termos idéias criativas de como fazer as coisas pararem de circular pelo Planeta. É urgente produzirmos o que precisamos localmente. Como começar? De uma maneira simples: consumirmos sempre a opção de produto local, pensarmos sempre se realmente precisamos daquela bugiganga que veio da China ou da Coréia para sermos felizes, comprarmos nosso alimento nas feiras de produtores locais ao invés de hipermercados, etc. Somente assim contribuiremos de fato para fomentar a produção local e para diminuir o desperdício de energia com o trânsito desnecessário de coisas. Tanto melhor para Mãe Terra!
*** Sugiro, aos que ainda não assistiram, o filme "A Estória das Coisas", disponível no youtube.