De repente, ouço um estrondo. Algo caiu lá no chão no
quintal. Logo penso que foi um abacate. Vou em busca dele por entre as
folhagens plantas, galhos, raízes... e encontro a maior graviola que eu já vi e
toda minha vida. Inteirinha. Sem um machucado. Oferecendo-se. Quando a abri,
não pude acreditar em meus olhos. Um branco que não é cor de tinta branca. É
cor de branco da natureza. Nenhum machucado, nenhum bichinho intruso, nenhum
pretinho daqueles que geralmente acompanham as graviolas que colho no meu quintal.
Não ligo para eles e os bichinhos que os provocam. Sempre ainda sobra muita
graviola para suco, cremes e mousses. Mas confesso que foi impactante ver
aquele fruto tão saudável, tão inteiro, tão branco e tão majestoso ali na minha
frente.
Outra vez, foi parecido. Daquela vez, eu estava na varanda
pensando no que faria para o almoço. De repente, aquele som surdo de coisa
caindo em cima da serapilheira que cobre o chão da minha florestinha. Era um
abacate. Enorme e maduro. Prontinho para virar guaca mole. Um luxo. O abacate
do meu quintal já está famoso de tão bom que ele é. Fruto enorme, caroço
pequeno. Muita polpa, verde clara, sem fio, macia, sedosa e saborosa. De vez em
quando encontro alguém que não vejo há tempos: “Ei, quando vamos colher abacate
no seu quintal de novo?”. O abacateiro é tão grande que é necessário uma
operação especial para a colheita. No mínimo 3 pessoas. Uma para subir e cortar
com o podão o pendão do fruto. E dois para segurarem o pano lá embaixo que
amortecerá a queda do abacate lançado lá de cima pela primeira pessoa. Como é
uma trabalheira subir lá no topo, já colhemos tudo o que damos conta. No mínimo
20 de cada vez. Depois dividimos a colheita entre os participantes.
Abundância...
A abundância é a regra da natureza. Ela sempre está em busca
de produzir excedentes para que todos tenham fartura. Os sistema naturais,
quando estão muito doentes e degradados, precisam de um tempo para acumular matéria
e energia. Depois desse período de acumulação, começa o período de prosperidade
no qual a produção é maior do que a necessária somente para a própria
manutenção. Produção de frutos, sementes, folhas, raízes, galhos... Abundância
que permite que cada vez mais seres possam ali se fartar. O sistema vai se
tornando cada vez mais rico e complexo. Quando a abundância é muito grande, o
sistema até pode exportar essa abundância e ajudar na recuperação de outros
sistemas ao redor.
Então, primeiro o sistema acumula, depois exporta. Inverter
as coisas é um desastre. Tentar extrair matéria e energia de um sistema que
ainda está em acumulação é sempre uma operação muito delicada. Deve-ser fazer
com muita cautela para evitar que o sistema emperre, se machuque ou até volte
para trás. Há que se pensar sempre em como ajudar o sistema a ir para frente,
para a abundância, e não o contrário. Mas, quando a gente chega na
abundância... ahhhh... é o deleite, a colheita farta, a tranquilidade, a paz...
e podemos então (devemos?) dividir, espalhar, doar.
Mas para chegar lá, muito serviço. O bom, é que no quintal,
o serviço é bom demais... cortar, picar, podar, plantar, cobrir o solo, semear,
cuidar. A natureza só pede que sigamos seu fluxo. Observando, interagindo,
entrando em contato empático com a natureza, ela nos mostra o que devemos fazer
para ajudá-la. Aguçar os sentidos é a nossa tarefa. Uma tarefa que não acaba
nunca pois que sempre mais profundamente é possível entrar nessa relação de
intimidade entre seres. Entre todos os seres.
Mas mais do que serviço, também bastante paciência.
Paciência para esperar, serenamente e, em serviço, a colheita e a abundância.
* texto originalmente publicado no Jornal Deusa Viva, da Teia de Thea (teiadethea.org), edição de março de 2013.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirOlá meu amigo. Muito bom o texto e esse abacate é nota 10 pelo jeito. Qual espécie ou qualidade ele é? como faço pra adquirir uma muda ou caroço? Sou de Montes Claros-MG. Muito boa sua iniciativa de valorizar a natureza e de dividir com próximo. Um grande abraço. DEUS abençoe
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